Nos últimos anos, em que eu praticamente nada escrevi, alguma coisa muito profunda mudou em mim. Reli meus textos antigos, da época de Capei, e não, eles não são tão arrogantes quanto eu me lembrava. Muitos têm um vocabulário comum pincelado num quase surrealismo sintagmático; era disso que eu mais me orgulhava, de como eu fazia poemas sem versos. Mesmo os antigos textos obcecados com Capei são lindos e inspiradores, apesar da toxicidade a que tanto me expus tentando consagrar o "amor perfeito".
Mas como eu disse, alguma coisa muito profunda mudou em mim. A política e o trabalho me exigiram endurecimento, e por muito tempo reneguei minha escrita academicista - ou como assim eu a enxerguei nos últimos anos, sem nem olhar para trás. Enterrei minha prolixidade passional junto ao fim de Capei, e voltei a trabalhar a escrita, após esse período de anos em hiato, de maneira mais sóbria, dura, seca, sombria.
Mas como eu disse, alguma coisa muito profunda mudou em mim. E digo isso não só pela brutalização a que a vida me forçou, por tanto trabalho, frustrações acadêmicas, doenças e perdas; essas coisas me tiraram do mundo sonhador do fim da adolescência e agressivamente me jogaram no mundo adulto da exploração da força de trabalho e do embrutecimento. Digo que alguma coisa muito profunda mudou em mim porque, no processo de lutar pela minha sanidade, tornei primeiro minha mente rígida, criei barreiras espessas de aço para sobreviver ao dia a dia da rotina de trabalho; e hoje, após muito treino, finalmente flexibilizei minha mente. Não mais um velho adolescente sofrendo por amor não correspondido, mas também não mais tão rigoroso a ponto de não conseguir mais escrever nada por receio de estar sendo minimamente abstrato. Hoje quero voltar a escrever o que me der vontade.