Sentado outra vez atrás da mesa de negociações, José não vê mais a hora antes do almoço de minuto em minuto; não tem mais importância. Nem muito mais o que o cliente lhe diz, ou quem o empurra quando está parado no meio de tanta gente passando. Ele lembra de coisas vagas, de memórias de dias atrás que já parecem cenas de filmes antigos em VHS, chuviscadas, o som distante. Estava entrando numa cozinha de teto baixo numa casa pequena, alguém lavando louça enquanto ele varria o chão. Agora ele estava chegando numa construção antiga, para esperar algumas horas antes do fim do expediente daqueles funcionários, com quem fez alguma amizade por conta de uma das pessoas que trabalhava lá. Agora já era madrugada e eles passeavam com certa apreensão entre prédios do campus, parando com alguma frequência para olhar as árvores. Agora eles estavam subindo numa árvore. Agora tudo brilhava na cidade litorânea à noite, do ponto mais alto da roda-gigante. E o mar aquela noite estava tão calmo quanto seus corações e seus olhares, como na vez em que viram as nuvens passarem detrás do relógio imenso, como quando se encontravam de manhã, sonolentos, antes das aulas...
José não existe mais.