quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Gritar na almofada é uma mentira


Talvez eu parasse de roer unhas se pudesse gritar o mais alto possível de vez em quando. Mas onde, sem que venham acudir ou acalmar? Sem que se sintam perturbados e queiram que eu pare? Casa, avenida, ônibus, metrô, faculdade, treino, ônibus, metrô, trabalho, metrô, ônibus, avenida, casa. Quando estarei sozinho e poderei gritar? No treino, grito. Mas não grito como gostaria. O grito que quero dar não é compatível com o treino, e causaria transtornos. Não quero ninguém perto de mim, ninguém perguntando o porquê. É porque é e, para todos os outros, ponto final.
É grito de desespero por todos os anos e estes meses. Por um arremedo de felicidade.
E não é só gritar; pelo menos não no primeiro grito. É correr e me jogar no chão, bater com um galho em outro, chutar a terra, a água, socar o ar, pular, quebrar uma pedra em outra, e isso o dia inteiro, até me machucar ou desmaiar.
Os gritos seguintes podem ser só gritos. Por algum tempo.
Mas têm de ser gritos; não são gritos os que são abafados pela almofada.

Lembro-me de você, agora, como sempre...
Mas há quanto tempo? Dias ou anos? Pode-se calcular? E que seriam mais dez anos? Ou vinte, quarenta, cem... todos. Quando foi a última vez? Hoje? Quarenta anos atrás?
Qual a quantidade de você que existiu?
Quem é você?

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